sábado, 10 de abril de 2010

... continuação

Mathieu, como passou a se chamar após ter visto esse nome nas páginas de um livro jogado ao chão, observava da janela, já saciado, os pássaros retirando-se rumo ao pôr do sol. Dona Maria surge entre seus devaneios que seguiam os pássaros, pegando e guardando o livro na estante do quarto de leitura. Nesse movimento deu para ver o título: “Idade da razão”.


O quarto de leitura é o espaço da casa mais intrigante. É dele que os bigodes/antenas de Mathieu percebem uma espécie de energia estática, um magnetismo presente, que vem, mais especificamente, daqueles objetos na parede que Dona Maria chama de “livros”. Foi por conta de um desses que “Chiquinho” (não sabe porque o chamavam assim) passou a se perceber como “Mathieu”. Não se importava com isso, na verdade. Apenas experimentava o som das palavras por curiosidade. Como um gato consegue ler é um dos acasos obscuros que surgem das comunicações silenciosas entre os seres.


Ao voltar a atenção para janela a luz difusa do lusco-fusco anunciava a noite, e quando a noite chega, em fim, as pupilas já não se contraem diante de uma luz dolorosamente limpa, e os telhados não queimam mais sob as patas. Por uma perspectiva, a cidade parece muito mais misteriosa e receptiva, emitindo seus sons e cheiros que vem, principalmente, de baixo das telhas. Uma telha quebrada era um apelo ao voyerismo, que Mathieu, timidamente, dispensava alguma atenção. Frestas, vidros, vãos entre os bares da cidade pareciam o lugar ideal para encontrar comida. Seu lugar favorito, no entanto, era a cozinha do “Paradoxo”, bar onde ele encontrava Luiz, um assistente de cozinha que, vez em quando, ia fumar um cigarro no depósito dos fundos. Foi assim que se conheceram, Mathieu chegando por entre as latas, Luiz fumando um cigarro e um prato com restos de filé com fritas entre eles.